Um estudo recente publicado no Cambridge Archeological Journal traz evidências de que caçadores-coletores da Era do Gelo, há cerca de 25 mil anos, usavam um sistema de notação “padronizado” para acompanhar o comportamento dos animais que eram suas presas (BACON, 2023).
Os desenhos, comuns em centenas de cavernas espalhadas pela Europa, incluem pontos, linhas e o símbolo “Y” e geralmente estão associados a imagens de animais.
A pesquisa, que envolveu a comparação entre esses desenhos e o ciclo de vida dos animais, mostrou que o número de pontos ou linhas em uma imagem correlaciona-se fortemente com o mês de acasalamento em todos os exemplos analisados, que incluem auroques, bisões, cavalos, mamutes e peixes.
Além disso, a posição do símbolo “Y” em uma sequência foi preditiva do mês de nascimento, sugerindo que “Y” significa “dar à luz”.
De acordo com os pesquisadores, essa é uma das primeiras evidências de um sistema de notação coerente e organizado já encontrado.
Isso indica que as pessoas na época eram capazes de interpretar o significado da posição de um item em uma sequência e planejar com antecedência para o futuro distante, usando uma espécie de calendário – reforçando a sugestão de que eram capazes de cognição complexa.
Embora alguns arqueólogos tenham especulado que as marcas poderiam estar relacionadas à medição do tempo, o objetivo específico delas permaneceu elusivo até agora.
O atual estudo, no entanto, trouxe fortes evidências de que essas marcações estão relacionadas ao registro do período de acasalamento e de nascimento dos animais.
Os pontos correspondem aos 13 ciclos lunares em um ano, pois os caçadores-coletores começavam o ano do calendário com o derretimento da neve na primavera.
Além disso, uma espécie de calendário meteorológico descoberto explicaria as diferenças de tempo entre diferentes locais.
Segundo os pesquisadores, o próximo passo da pesquisa será revisar e verificar as interpretações das marcações, para tentar construir um “dicionário” da misteriosa língua primitiva.
Críticos linguistas argumentam, no entanto, que a falta de sintaxe e gramática convencionais, faz com que as marcas não sejam consideradas uma escrita formal.
Contudo, os pesquisadores não concordam com essa opinião, e defendem que essas marcas são uma forma de guardar memórias fora da mente e este é um dos principais objetivos da escrita.
Para os pesquisadores, isso representa um grande salto cognitivo, uma vez que permite que informações sejam preservadas e transmitidas através do espaço e do tempo.
De qualquer forma, essa pesquisa mostra que os caçadores-coletores da Era do Gelo eram capazes de realizar pensamentos complexos e de planejar a longo prazo, e sugere que as pessoas em diversas partes do mundo podem ter desenvolvido maneiras de se comunicar e registrar informações muito antes do surgimento da escrita convencional.
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Referências
BACON, Bennett et al. An Upper Palaeolithic Proto-writing System and Phenological Calendar. Cambridge Archaeological Journal, p. 1-19, 2023.. Disponível em: <link>. Acesso em: 6 maio 2023.
Cite-nos
SANTOS, Fábio. Arte rupestre da Era do Gelo sugere primeira forma de escrita coerente. Ciência Mundo, maio 2023. Disponível em: . Acesso em: 05 maio 2024.