Utilizar o mesmo mecanismo de produção de energia das estrelas está mais próximo de se tornar realidade. Em um experimento recente, cientistas europeus conseguiram bater um novo recorde em quantidade de energia liberada em uma reação de fusão sustentada.
Os pesquisadores do Joint European Torus (JET) – reator experimental no Reino Unido que investiga métodos de produção de energia através da fusão nuclear – realizaram um experimento onde foram obtidos 59 megajoules de calor, durante uma explosão de fusão de cinco segundos. Este valor é considerado um recorde, pois quase dobra a marca anterior, que foi de 21,7 megajoules, em 1997, na mesma instalação.
O feito foi alcançado após mais de duas décadas de experimentos no Culham Center for Fusion Energy (CCFE) – centro de pesquisa que abriga o reator JET – e está sendo considerado um marco importante no caminho para alcançarmos uma fonte de energia viável e sustentável.
Para o professor Ian Chapman, chefe-executivo da Autoridade de Energia Atômica do Reino Unido, os pesquisadores do JET deram um grande passo para solucionar um dos maiores desafios da humanidade: a energia sustentável. Segundo ele, todas as grandes questões do futuro – como as viagens espaciais, a escassez de recursos naturais e os efeitos das mudanças climáticas – esbarram, de alguma forma, na necessidade de produção de energia eficiente, limpa e segura, e a fusão nuclear é, até agora, a nossa aposta mais promissora.
Na fusão nuclear dois ou mais núcleos atômicos se unem para formar um outro núcleo de maior número atômico. Esse processo libera uma grande quantidade de energia e produz bem menos resíduos radioativos do que a fissão nuclear, que, ao contrário, consiste na divisão de um núcleo atômico pesado e instável.
Há muita expectativa em torno da fusão nuclear, pois além de ser uma tecnologia de produção de energia limpa, sua eficiência deixa para trás qualquer abordagem de queima tradicional. Um quilograma de combustível de fusão contém 10 milhões de vezes mais energia do que um quilograma de carvão, petróleo ou gás. Por isso, vários empreendimentos de pesquisa, públicos e privados, têm sido criados visando desenvolver esta tecnologia quanto antes.
O JET, por exemplo, investiga a viabilidade da fusão através de dois isótopos de hidrogênio: o deutério e trítio. Ele consiste em um reator em forma de rosquinha capaz de conter plasmas ou gases ionizados, que podem chegar a 150 milhões de graus Celsius, 10 vezes mais quente que o núcleo do Sol. Com essa temperatura os núcleos atômicos podem se fundir para formar novos elementos, liberando uma grande quantidade de energia no processo. No Sol essa mesma fusão nuclear pode ser realizada em temperaturas mais baixas em virtude da gravidade intensa.
Os resultados obtidos no JET fornecem dados para outros projetos maiores, como o ITER (International Thermonuclear Experimental Reactor) que está sendo desenvolvido no sul da França. O ITER está previsto para ser ativado em 2035 e promete ser o primeiro reator a gerar mais energia do que o necessário para manter seu plasma em alta temperatura. Se tudo der certo no ITER, a próxima etapa será a construção da Usina de Demonstração Europeia para o fornecimento de energia elétrica.
Mas a energia de fusão ainda tem alguns desafios. Por exemplo, enquanto o deutério é facilmente encontrado na água do mar, o trítio (ou hidrogênio-3) deve ser sintetizado em reatores, por ser muito raro na natureza. Os futuros projetos de energia de fusão devem contornar este problema, produzindo o seu próprio combustível de trítio em suas instalações.
Segundo Mark Wenman – do Colégio Imperial de Londres – embora o experimento tenha produzido energia de fusão por apenas cinco segundos, isso foi tempo suficiente para mostrar que a estratégia com os isótopos de hidrogênio funciona. Esta é a nossa melhor alternativa para mostrar ao mundo que a fusão é uma fonte de energia viável e sustentável. Se a reação pôde ser mantida por cinco segundos, presumivelmente ela poderá ser mantida estável por um tempo maior. Para ter utilidade prática na produção contínua de energia, ela deverá permanecer ininterrupta.
Para o professor Ian Fells – especialista em conversão de energia da Universidade de Newcastle – os resultados obtidos pelos pesquisadores do JET são um marco histórico na produção de energia de fusão. Precisamos agora utilizar este conhecimento para produzir energia limpa e mitigar os efeitos das mudanças climáticas.
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Notícias
Nuclear fusion heat record a ‘huge step’ in quest for new energy source. The Guardian, 2022. Disponível em: <link>. Acesso em: 10 fev. 2022.
Major breakthrough on nuclear fusion energy. BBC New, 2022. Disponível em: <link>. Acesso em: 10 fev. 2022.
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SANTOS, Gabriel. Energia de fusão nuclear está mais próxima graças a um experimento realizado por cientistas europeus. Ciência Mundo, Rio de Janeiro, fev. 2022. Disponível em: . Acesso em: .