Computadores quânticos são dispositivos que aproveitam fenômenos quânticos para processar dados. Eles ainda estão em fase de pesquisa, mas quando estiverem disponíveis, serão substancialmente mais rápidos do que os computadores clássicos para realizar cálculos complexos e exponenciais.
A unidade básica de um computador clássico é o bit, que só pode assumir os valores 0 ou 1. Um computador quântico, por outro lado, utiliza o bit quântico (ou qubit), que permanece em um estado incerto (ou superposição) entre 1 e 0 até ser medido, quando, obrigatoriamente assume um dos valores.
Criar processadores com qubits é uma tarefa desafiadora, pois os cientistas têm que lidar com fenômenos quânticos, ainda pouco intuitivos. Várias estratégias têm sido investigadas para se criar qubits de alta qualidade e uma delas é a utilização de polarons de Rydberg, quasipartículas criadas em átomos ultra frios capazes de alternar entre os estados de luz (ou ondas) e matéria.
Em um trabalho recente, o pesquisador Hamid Ohadi — da Universidade de St. Andrews , no Reino Unido — e colegas conseguiram criar polarons de Rydberg com a ajuda de lâminas de uma pedra extraída da Namíbia, contendo cristais de óxido cuproso (Cu2O) (ORFANAKIS, 2022).
A pedra foi comprada no eBay e dela foram extraídos cristais, que foram polidos e laminados para uma espessura de 30 μm (micrômetros, ou milionésimos de um metro). Estas lâminas foram posicionadas entre dois espelhos, formando uma espécie de sanduíche, onde foram injetadas ondas de luz de determinadas frequências. O experimento produziu polarons de Rydberg com 100 vezes mais eficiência que os outros métodos conhecidos.
O que torna os polarons de Rydberg tão especiais é sua capacidade de mudar continuamente entre o estado de luz e matéria. É justamente essa flexibilidade em alternar entre os estados quânticos que os pesquisadores estão explorando para produzir os qubits. Os polarons, permanecem indefinidos até serem observados, quando então, devem, obrigatoriamente, assumir um estado, ou de luz, ou de matéria.
Os polarons de Rydberg são produzidos através de excitons, quasipartículas formadas quando um elétron é deslocado para longe do seu átomo de origem, formando um átomo gigante com sua nova órbita. O átomo original se torna positivo, mas continua “segurando” o elétron fugitivo a distância. O local na órbita original, de onde o elétron saiu, passa a se chamar “buraco”.
O efeito polaron de Rydberg ocorre quando o elétron fica constantemente pulando entre o buraco e a órbita distante, sem se saber onde ele está, até que seja aferido. O óxido cuproso encontrado na Namíbia é um semicondutor extremamente eficiente para se criar esse efeito.
Segundo Ohadi, “essa descoberta nos aproxima um pouco mais de produzir qubits para processadores quânticos através de polarons, uma estratégia ainda pouco investigada. Um computador quântico totalmente funcional construído com essa tecnologia ainda está longe de ser criado, mas agora estamos mais perto do que nunca de poder montar um”.
Os pesquisadores alertam, no entanto, que os métodos descritos neste trabalho precisam ser refinados para que essas partículas sejam efetivamente usadas em circuitos quânticos.
Detalhes interessantes dos polarons de Rydberg
Os polarons de Rydberg podem ser produzidos em laboratório através de um ressonador óptico — dois espelhos faceados perfeitamente paralelos, “eternamente” repicando ondas de luz — em temperaturas próximas ao zero absoluto. Para se conseguir os polarons os espelhos devem ser aproximados o equivalente à metade do comprimento de onda da frequência de luz desejada, criando assim, um micro ressonador.
Além disso, o espaço entre os espelhos deve ser preenchido com uma lâmina ultra fina, feita de um material especial, que servirá como “poço quântico” para manter os elétrons encurralados. O material utilizado no atual trabalho foi o óxido cuproso (Cu2O) extraído da Namíbia.
Quando uma onda de luz com certo comprimento passa através do poço quântico, ela fornece energia para liberar um elétron de um átomo do material especial, que fica preso no poço criando um grande espaço. Nesta situação, o átomo se torna positivamente carregado, em virtude do espaço vazio de onde saiu o elétron, que os físicos chamam de “buraco”.
Contudo, o elétron liberado permanece preso na órbita do átomo, devido a baixíssima temperatura, as cargas opostas e ao fato deles estarem no mesmo poço quântico. Este comportamento quântico forma uma nova quasipartícula gigante chamada exciton.
Eventualmente, o elétron retorna ao buraco fazendo com que o exciton deixe de existir. Esse processo libera energia através de uma onda de luz com a mesma intensidade e frequência da que criou originalmente o exciton. Essa mesma onda de luz pode novamente intersectar outro elétron no poço quântico, reiniciando o processo.
Quando o sistema inteiro está devidamente calibrado, de forma que a luz ressonante e o exciton tenham a mesma frequência, um único exciton pode ser convertido em onda luminosa, o qual se converte novamente em exciton, e assim sucessivamente.
Essa repetição cíclica entre onda luminosa e exciton não só é possível, como também é desejada pelos pesquisadores. Como o exciton e a luz estão constantemente permutando, eles se comportam como uma nova partícula designada de polaron, que tem propriedades de matéria e onda, ao mesmo tempo, sendo uma ótima alternativa para a criação de qubits.
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Referências
ORFANAKIS, Konstantinos et al. Rydberg exciton–polaritons in a Cu2O microcavity. Nature Materials, p. 1-6, 2022.. Scientific reports, v. 9, n. 1, p. 1-10, 2019. Disponível em: <link>. Acesso em: 19 abr. 2022.
Notícias
An Ancient Namibian Stone Could Hold The Key to Unlocking Quantum Computers. Science News, 2022. Disponível em: <link>. Acesso em:19 abr. 2022.
Ancient Namibian stone holds key to future quantum computers. University of St Andrews, 2022. Disponível em: <link>. Acesso em:19 abr. 2022.
Cite-nos
SANTOS, Gabriel. Pedra africana pode ser a chave para a computação quântica. Ciência Mundo, Rio de Janeiro, abr. 2022. Disponível em: . Acesso em: .