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Assentamento de 3600 anos é descoberto por satélite na Península Arábica

Esta civilização avançada pode ter sucumbido a um incêndio há 3600 anos, segundo a datação por carbono.

Assentamento de 3600 anos é descoberto por satélite na Península Arábica -

Imagem: HEGGY (2022).

A estrutura de um antigo assentamento que existiu há mais de 3600 anos, foi descoberta pela Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID) enquanto procurava por fontes de água subterrânea na Península Arábica Oriental.

A área, que tem o formato de um retângulo medindo 2 x 3 km, foi identificada através de imagens de satélite em uma região do Catar, que para os arqueólogos, sempre foi desprovida de evidências de civilizações antigas e sedentárias. Com este achado a teoria de que esta sempre foi uma península completamente nômade começa a ser questionada.

(A)  Localização do Catar na península arábica. (B) Distribuição dos aquíferos no Catar. Quanto mais vermelho, mais salino. O quadrado preto representa a região onde o assentamento foi localizado. (C) Região do assentamento.
(A) Localização do Catar na península arábica. (B) Distribuição dos aquíferos no Catar. Quanto mais vermelho, mais salino. O quadrado preto representa a região onde o assentamento foi localizado. (C) Região do assentamento.
Imagem: HEGGY, 2022.

A descoberta foi publicada por Essam Heggy – cientista espacial da Universidade do Sul da Califórnia – no ISPRS Journal of Photogrammetry and Remote Sensing (HEGGY, 2022).

O local, batizado pelos pesquisadores de “Makhfia“, que na língua local significa “um lugar invisível“, não pode ser visto do espaço por imagens normais de satélite, nem por observações na superfície terrestre. Para identificá-lo, foram necessárias ferramentas de software sofisticadas, que processaram as imagens de um sistema de radar de alta resolução em conjunto com os satélites japoneses ALOS1 e ALOS2.

(A)  e (C) imagens ópticas dos satélites. (B) e (D) imagens processadas de radar do satélite ALOS-2. A estrutura retangular aparece apenas na imagem processada de radar.
(A) e (C) imagens ópticas dos satélites. (B) e (D) imagens processadas de radar do satélite ALOS-2. A estrutura retangular aparece apenas na imagem processada de radar. Podem ser observadas três grandes depressões que acumulam água das chuvas. O assentamento está sobre uma dessas depressões.
Imagem: HEGGY, 2022.

Mesmo sendo um local invisível, pode-se perceber pelas imagens processadas do satélite, que há uma estrutura grande, retangular e subterrânea, construída por mãos humanas, sugerindo um assentamento. Além disso, a textura e a composição do solo no local contrastam nitidamente com o aspecto geológico ao redor, sugerindo alguma atividade de plantio ou paisagismo.

Heggy descreve o local como uma fortaleza natural, no meio de um terreno muito acidentado, quase inacessível. Embora as edificações do assentamento não possam ser diretamente observadas, graças às imagens de satélite, podemos “enxergar” as provas no subsolo.

Textura do solo no local do assentamento, bem diferente dos arredores.
Imagem: HEGGY, 2022.

Segundo Heggy, esta descoberta tem grande valor histórico, pois essa pode ser a primeira evidência de uma comunidade sedentária na região. Ele afirma que não é comum um assentamento deste tamanho estar tão distante do litoral, onde se encontravam as civilizações mais antigas. No verão, a região tem temperatura média de 43 0C, o que proporciona um ambiente extremamente inóspito para se morar.

As evidências registradas do espaço indicam que a população tinha uma compreensão sofisticada de como usar a água subterrânea. Isso explica por que o assentamento ficou em vigor por um longo período, já que a agricultura nessa região do Catar depende até hoje da compreensão dos aquíferos para prosperar. Esta foi uma proeza de engenharia avançada que deixou até os pesquisadores perplexos.

A datação por carbono, que utilizou amostras de carvão, abundantemente encontradas no subsolo, sugere que o local tem pelo menos 3650 anos, bem próximo da era da civilização Dilmun.

Segundo Heggy, esta quantidade incomum de carvão no subsolo tem um lado sombrio. Como não há registro de quem era essa cultura e como eles desapareceram, os pesquisadores trabalham com a hipótese de um incêndio ter destruído o local. Contudo, essa hipótese exige um maior estudo desta área por arqueólogos, já que essa é apenas uma de várias explicações plausíveis para essa quantidade expressiva de carvão no local.

Deveríamos nos preocupar tanto com as ruínas de um antigo assentamento? Para Heggy, a capacidade dessa cultura em achar soluções para resolver problemas com a escassez de água é invejável. Podemos pensar que os desertos, que cobrem 10% da superfície do nosso planeta, sempre foram inabitáveis, mas essa descoberta mostra que isso não é verdade.

Mas por que essas pessoas se instalaram ali? Havia algo valioso no local? Estavam fugindo de alguém ou de mudanças climáticas? Compreender a motivação dessas pessoas pode nos ajudar a escrever também nossa história.

Heggy está empolgado com a descoberta, e diz que os próximos trabalhos de rastreio dos desertos terão novos recursos de mapeamento de superfície e fornecerão informações ainda mais valiosas sobre a presença humana e a evolução paleoclimática de regiões áridas.

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Referências

HEGGY, Essam et al. Exploring the nature of buried linear features in the Qatar peninsula: Archaeological and paleoclimatic implications. ISPRS Journal of Photogrammetry and Remote Sensing, v. 183, p. 210-227, 2022. Disponível em: <link>. Acesso em: 02 fev. 2022.

Notícias

Evidence of 3600 + year old settlement uncovered in Eastern Arabian Peninsula. Heritage Daily, 2022. Disponível em: <link>. Acesso em: 1 fev. 2022.

Cite-nos

SANTOS, Gabriel. Assentamento de 3600 anos é descoberto por satélite na Península Arábica. Ciência Mundo, Rio de Janeiro, jan. 2022. Disponível em: . Acesso em: .


Graduado em Sistemas de Informação pela FEUC-RJ e mestre em Representação de Conhecimento e Raciocínio pela UNIRIO. Fábio é editor e fundador do portal Ciência Mundo. É dedicado à produção de conteúdos relacionados a astronomia, física, arqueologia e inteligência artificial.