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Diamante vindo das profundezas revela um mundo subterrâneo repleto de água

Gema de Diamante formada a 660 quilômetros de profundidade sugere haver um ambiente rico em água naquela região.

Diamante vindo das profundezas revela um mundo subterrâneo repleto de água -

Imagem: Tomislav Jakupec em Pixabay.

Nas profundezas do nosso planeta agitações enigmáticas ocorrem o tempo todo, mas observar tais fenômenos é uma tarefa desafiadora já que essa é uma região que está muito além do nosso alcance.

Eventualmente nosso planeta “cospe” uma pista do que está acontecendo lá embaixo, na forma de gemas de diamantes contendo pequenas inclusões de minerais raros. Essas pequenas inclusões, que são minerais que ficaram presos dentro do diamante durante sua formação, nos fornecem dados que nos ajudam a entender o que acontece no interior do nosso planeta.

Uma dessas gemas de diamante, descoberta em uma mina em Botswana, apresenta diversas falhas contendo vestígios de ringwoodita, ferropericlase, enstatita e outros minerais, sugerindo que a pedra se formou a 660 quilômetros abaixo da superfície da Terra.

O diamante, que está sendo estudado pelo físico mineral Tingting Gu e sua equipe do Instituto Gemológico de Nova York e da Universidade de Purdue, também dá pistas de que seu ambiente de formação, uma zona de transição entre o manto superior e inferior, é rico em água (GU, 2022).

Análise microscópica das pequenas inclusões encontradas no diamante subterrâneo.
Imagem: GU, 2022.
Análise microscópica das pequenas inclusões encontradas no diamante subterrâneo.
Imagem: GU, 2022.

“A ocorrência de ringwoodita em inclusões hidratadas indica um ambiente úmido nessa região subterrânea”, aponta Gu.

Segundo os pesquisadores, grande parte da superfície terrestre é coberta por oceanos. No entanto, se considerarmos todo o espaço que existe entre a superfície e o centro da Terra, essa água superficial representa apenas uma “pequena poça”. Mesmo nas regiões mais profundas a distância entre o fundo do oceano e a superfície das ondas é de apenas 11 quilômetros, contra 6.371 quilômetros de distância da superfície da Terra até o seu núcleo.

Contudo, a crosta terrestre possui várias “rachaduras” que são as bordas das placas tectônicas que se friccionam o tempo todo, umas sobre as outras. Nessas zonas de subducção, a água penetra profundamente, podendo chegar até o manto inferior.

Com o tempo, essa água retorna à superfície através das atividades vulcânicas. Este ciclo de absorção e expulsão da água é conhecido como o ciclo das águas profundas. Saber como esse sistema funciona e quanta água existe no subterrâneo é importante para entendermos as atividades geológicas do nosso planeta. A água influencia na explosividade das erupções vulcânicas e pode também atuar nas atividades sísmicas.

Como não podemos ir ao subterrâneo, temos que esperar as evidências da água chegarem até nós, como esses diamantes cheios de inclusões, formados em condições de calor e pressão extremos.

Ao estudar o diamante de Botswana, Gu e seus colegas encontraram 12 inclusões minerais e um aglomerado de inclusão leitosa. Usando espectroscopia micro-Raman e difração de raios-X, os pesquisadores examinaram essas inclusões para determinar sua natureza.

Entre as inclusões, eles encontraram um conjunto de ringwoodita (silicato de magnésio) em contato com ferropericlásio (óxido de magnésio/ferro) e enstatita (outro silicato de magnésio com composição diferente).

Nas altas pressões na zona de transição, ringwoodite se decompõe em ferropericlase, bem como outro mineral chamado bridgmanite. Em pressões mais baixas perto da superfície, bridgmanite torna-se enstatite. Sua presença no diamante conta a história de uma jornada, indicando que a pedra se formou nas profundezas antes de chegar a crosta.

O mais surpreendente de tudo, para os pesquisadores, foi que a ringwoodita tinha características sugerindo ser de natureza hidratada, uma variação desse mineral que se forma em água pressurizada. Além disso, outros minerais encontrados no diamante, como a brucita, também são hidratados. Essas pistas sugerem que o ambiente em que o diamante se formou estava bastante úmido.

Evidências de água na zona de transição entre o manto superior e inferior já foram encontradas antes, mas essas evidências nunca foram suficientes para avaliar a quantidade de água lá embaixo. Teria sido essa inclusão casual provocada por um pequeno bolsão de água, ou o mundo subterrâneo é realmente úmido?

“Embora a formação de diamantes do manto superior seja frequentemente associada à presença de fluidos, diamantes superprofundos com conjuntos minerais retrogredidos semelhantes raramente foram observados acompanhados de minerais hidratados”, afirma os pesquisadores em seu artigo.

“A ringwoodita hidratada identificada neste trabalho mostra que há um ambiente amplamente hidratado a uma distância de 660 quilômetros”, sugere Gu.

Pesquisas anteriores apontam que a Terra está sugando muito mais água do que pensávamos antes, e talvez este trabalho possa finalmente nos dar uma pista de para onde este “oceano” está indo.

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Referências

GU, Tingting et al. Hydrous peridotitic fragments of Earth’s mantle 660 km discontinuity sampled by a diamond. Nature Geoscience, p. 1-5, 2022. Disponível em: <link>. Acesso em: 29 maio 2022.

Notícias

Diamond From 660 Kilometers Below Earth’s Surface Reveals a Water-Rich Environment. ScienceAlert, 2022. Disponível em: <link>. Acesso em: 15 maio 2022.

Cite-nos

SANTOS, Gabriel. Diamante vindo das profundezas revela um mundo subterrâneo repleto de água. Ciência Mundo, Rio de Janeiro, out. 2022. Disponível em: . Acesso em: .


Graduado em Sistemas de Informação pela FEUC-RJ e mestre em Representação de Conhecimento e Raciocínio pela UNIRIO. Fábio é editor e fundador do portal Ciência Mundo. É dedicado à produção de conteúdos relacionados a astronomia, física, arqueologia e inteligência artificial.