Você já teve a sensação de estar experimentando uma situação pela qual já passou antes, mesmo sabendo que isso é impossível? Esse é o famoso déjà vu, que em francês significa “visto antes”, um fenômeno que intriga filósofos, neurologistas e escritores há muito tempo.
Muitas teorias já foram propostas para tentar explicar esse fenômeno, normalmente associando alguma disfunção mental temporária, mas, até pouco tempo, o tema ainda não havia sido tratado com a devida seriedade pela ciência.
Somente no início dos anos 2000, foi que um cientista chamado Alan Brown decidiu fazer uma revisão bibliográfica de tudo o que já havia sido produzido sobre o déjà vu até aquele momento.
Como já era esperado, muito do que foi encontrado tinha um certo sabor paranormal ou sobrenatural, com relatos de “experiência de vidas passadas”, “habilidades psíquicas”, “bug na Matrix”, etc.
No entanto, Brown também encontrou pesquisas sérias que estudaram pessoas comuns relatando cientificamente suas experiências de déjà vu. Ao isolar esses artigos sérios, Brown fez algumas descobertas básicas sobre o fenômeno.
Os dados da revisão revelam que cerca de dois terços das pessoas experimentam o déjà vu em algum momento de suas vidas, sendo o gatilho mais comum para o fenômeno uma cena em algum lugar ou uma conversa.
Brown também examinou sugestões de um século da literatura médica em busca de possíveis associações entre o déjà vu e alguns tipos de convulsões cerebrais.
Em seu relatório final, Brown descreve o déjà vu de forma técnica e científica, expondo todos os aspectos do fenômeno para outros cientistas cognitivos que também queiram estudar o tema. Atualmente, seu trabalho é um dos principais catalisadores do assunto para experimentos que investigam o déjà vu.
Testando o déjà vu em um laboratório de psicologia
Inspirados pelo trabalho de Brown, a Dra. Anne Cleary e sua equipe — da Universidade do Estado do Colorado nos EUA — começaram a realizar experimentos com o objetivo de testar algumas hipóteses sobre os possíveis mecanismos por trás do déjà vu (CLEARY, 2021).
No trabalho apresentado neste artigo, foi investigada, especificamente, a hipótese de que o déjà vu ocorre quando há alguma semelhança espacial entre uma cena atual e uma cena não lembrada, mas armazenada na memória. Os psicólogos chamaram essa conjectura de hipótese da familiaridade da Gestalt.
Para entender como esse fenômeno cognitivo funciona, imagine que você esteja chegando na recepção de um hospital para visitar um amigo doente. Embora você nunca tenha ido a este local, você fica impressionado com a sensação de que já esteve neste hospital antes.
De acordo com a hipótese da familiaridade da Gestalt, o que causa essa experiência de déjà vu é a semelhança que o layout da cena, incluindo a colocação dos móveis e de alguns objetos chave nesse espaço, tem com o mesmo layout de uma cena diferente que você experimentou no passado.
Talvez, a forma como a recepção está situada, os itens no balcão e a posição de algum corredor próximo estejam dispostos do mesmo jeito que um conjunto de mesas de uma festa de confraternização da qual você participou no ano passado. De acordo com esta hipótese, se aquela situação anterior com um layout semelhante ao atual não vem à mente, você pode ficar com um forte sentimento de familiaridade com o local atual.
Para testar esta hipótese em laboratório, Cleary e sua equipe utilizaram a realidade virtual para avaliar a reação de alguns participantes voluntários dentro de cenas controladas. Para este experimento, foram criadas cenas virtuais que, embora distintas, compartilham o mesmo layout.
Como previsto, o déjà vu era mais provável de acontecer quando as pessoas estavam em uma cena que continha o mesmo arranjo espacial de elementos de uma cena anterior que viram, mas não se lembravam.
Os resultados obtidos pelos pesquisadores mostraram que a semelhança espacial de uma nova cena com outra parcialmente existente na memória, mas que não pode ser conscientemente lembrada no momento, pode disparar a sensação de déjà vu.
Segundo Cleary, não se sabe ainda se a semelhança espacial é a única causa para este fenômeno, já que não existe um estudo exaustivo que aponte para todos os fatores que contribuem para uma cena ou situação parecer familiar.
Os pesquisadores afirmam que outras pesquisas estão em andamento para investigar possíveis fatores adicionais em jogo nesse fenômeno misterioso.
Este artigo foi republicado e adaptado do site The Conversation com uma licença de autorização Creative Commons. Leia o artigo original (EM INGLÊS).
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Referências
CLEARY, Anne M.; BROWN, Alan S. The Déjà Vu Experience. Routledge, 2021.
What is déjà vu? Psychologists are exploring this creepy feeling of having already lived through an experience before. The Conversation. 2022. Disponível em: <link>. Acesso em: 5 out 2022.
Notícias
The Mysterious Phenomenon of Déjà Vu Is Finally Closer to Being Explained. Science Alert, 2022. Disponível em: <link>. Acesso em: 5 out 2022.
Cite-nos
SANTOS, Gabriel. O misterioso fenômeno do déjà vu está finalmente prestes de ser explicado. Ciência Mundo, Rio de Janeiro, out. 2022. Disponível em: . Acesso em: .